Daniel Levine, especialista em tendências de negócios, foi o primeiro orador da VisitPortugal CONFERENCE, que aconteceu a 11 de março na Estufa Fria, em Lisboa. Na sua apresentação "IA e eu: Navegando Tendências de Negócios na Era Da Inteligência Artificial", destacou a importância de compreender o que os turistas desejam e de responder de forma rápida e assertiva.

Defendeu que bem-estar, transparência e originalidade são fundamentais para o setor. Sublinhou ainda a necessidade de antecipar tendências e usar tecnologia para manter Portugal competitivo. Em entrevista à TRAVEL MAGG, falou sobre os desafios que Portugal enfrenta enquanto destino turístico.

Leia a entrevista

Quero começar por lhe perguntar, uma vez que conhece tão bem Portugal e tem essa paixão pelo nosso País, o que estamos a fazer bem e o que estamos a fazer mal na indústria do turismo?
Portugal tem muita sorte porque o produto é fantástico. A maioria dos países não tem essa sorte. O que vocês têm aqui é incrível. As pessoas já conhecem Portugal, não é segredo. Falo com muitas organizações governamentais de turismo de países que não são tão conhecidos e o que vejo é que o desafio de Portugal não é o produto. O produto é excelente, é incrível, as pessoas querem vir aqui. O problema está no marketing e em como alcançar os viajantes.

Não quero ofender nenhum português mas... Portugal tem dificuldade em dar resposta rápida aos clientes. Não é um dos melhores do mundo a dar respostas imediatas aos clientes e a retornar-lhes. Acho que muitos dos sites que os fornecedores de turismo portugueses usam não são muito bons. Precisam mesmo de atualizar os seus sites. Muitas vezes são o principal ponto de contacto. Não se tem dado atenção suficiente a essa área. E é uma coisa relativamente fácil de fazer. Vou dar-lhe um exemplo. Se fizer uma reserva num hotel independente, um hotel português, geralmente, usa um site externo para fazê-lo, tudo certo. Mas depois, se precisar de alterar ou modificar a reserva, não há forma de o fazer. Tem de ligar, e isso pode ser um desafio. Este é apenas um exemplo do que vi na indústria.

Falou sobre o PIB de Portugal em relação ao turismo e como está a crescer. Mas existem alguns desafios, porque estamos a vender-nos e somos percecionados como um destino barato. Acha que isso pode ser prejudicial para um país que se quer vender como um destino turístico?
Uma das coisas com as quais tenho trabalhado com vários governos no setor do turismo é o excesso de turismo. Obviamente, isso também é um grande problema aqui. O que acontece é que, quando se trata da autoridade de turismo do país, eles são medidos pelo número de chegadas de visitantes. Este é praticamente o principal critério que usam. Não é o critério certo. Isto está ligado à sua pergunta, porque não se trata de trazer mais pessoas. Trata-se de trazer menos pessoas, mas que gastem mais dinheiro. Não há dúvida de que é aí que o futuro está.

Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março
Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março

O turismo não opera num vácuo. Está ligado a tudo o resto. Quando fala em aumentar os preços, isso não significa só no turismo, mas no país em geral. Não se pode fazer isso de qualquer maneira. É um problema grande. A resposta é que isso não é apenas responsabilidade do governo fazer isso nem apenas do setor privado. Eles têm de trabalhar melhor em conjunto, conectando as coisas para perceberem quais são os benefícios para todos e que mudanças podem ser feitas. Dito isto, Portugal está a fazer isso lentamente. Está muito mais caro do que era há 10 anos. As coisas demoram o seu tempo. Nada do que estou a dizer é particularmente único. Acho que, talvez, apenas a ideia de ter isso em mente como objetivo seja boa para o turismo.

Como acha que as redes sociais, em particular os influenciadores, estão a remodelar a procura e a oferta no turismo?
Acho que há aspectos positivos e negativos. Vamos começar pelos negativos. Muitas vezes, estou a andar na rua e vejo uma fila de pessoas na esquina para entrar numa loja de biscoitos. Penso logo, "ah, isso é uma loja de biscoitos do Instagram". Pessoalmente, como o tipo de viajante que sou, penso que essas pessoas são o que se pode chamar de lemingues. É um tipo de animal que está sempre a ir atrás de alguma coisa.

Mas, por outro lado, todas essas pessoas na fila estão a deixar as coisas boas para mim (risos)! Agora a sério. Isto significa que os fornecedores de turismo têm de saber quem é o seu público. Se o teu público é o tipo de pessoas que está no Instagram ou no TikTok, então, obviamente, tens de interagir com o teu público dessa forma. É algo semelhante às formas de pagamento aceites. Vais aceitar cartões? Vais aceitar dinheiro? Vais aceitar transferência bancária? Não sei. Não interessa o que tu queres. O que interessa é o que o teu cliente quer. Se os teus clientes estão a pagar de uma certa forma, seria útil aceitar essa forma. A mesma coisa acontece com o marketing. Se os teus clientes encontram lugares para visitar através do TikTok, então deves estar no TikTok. Isso tem sido claramente muito benéfico para muitos negócios. Muitos outros negócios, que não fazem ideia de como usar as redes sociais, acho que estão um pouco confusos.

"Se o teu público é o tipo de pessoa que está no Instagram ou no TikTok, então, obviamente, tens de interagir com o teu público dessa forma."

Devem alguns negócios usar as redes sociais?
Não. Se os seus clientes não usam redes sociais, então isso não é muito importante para eles. Se os seus clientes ainda usam o Facebook, por exemplo, então devem estar no Facebook. É por isso que é tão importante saber quem são os clientes.

O Facebook tem sido muito desconsiderado nos últimos anos. Existem muitos grupos no Facebook onde as pessoas conversam e trocam informações. Todos estão a pensar no Instagram, no TikTok, mas o Facebook ainda está lá. Ainda há dinheiro lá.
Sim. Acho é que o público do Facebook é um pouco mais velho. Novamente, se é esse o público que estás a atrair, então sim, deves estar no Facebook. Esquece o TikTok se não quiseres atrair adolescentes.

Acha que a indústria do turismo está a atender as necessidades da geração Z e também da geração alpha? O que sinto é que a forma de comunicar é um pouco ultrapassada. 
Só para esclarecer, está a dizer que achas que os fornecedores de turismo não sabem comunicar para essas gerações?

Bem, essa é a minha perspectiva. Não sei se estou certa ou não. Quero saber a sua opinião sobre isso.
A minha opinião é que, relativamente a Portugal, tem razão. Esse é um ponto onde Portugal está um pouco atrás. As pessoas não estão tão preparadas para fazer estas coisas. É uma área onde há muito espaço para melhorar.

Quando é que o turismo se torna "demasiado" turismo, quando há problemas habitacionais, como em Lisboa, Barcelona, Londres? Quando e quem deve parar e como? Porque se está a trazer dinheiro, nunca vai parar. E quanto às pessoas que têm de trabalhar e viver nessas cidades?
Tenho muita empatia por essas pessoas. A resposta tem de vir do governo e dos fornecedores de turismo. Alguns países, quando começaram, e até agora, estão a dizer aos turistas, "não venham, vão para aqui". Isso atribui a culpa às pessoas erradas. Não podes pedir aos turistas para assumirem a responsabilidade de onde vão ou o que querem fazer. Essas iniciativas têm de vir do governo.

O que é muito interessante para mim é que diferentes países e cidades ao redor do mundo, que têm o mesmo problema que Lisboa, estão a responder a esse problema do excesso de turismo de formas diferentes. Não há uma solução única. Por exemplo, em Amesterdão, estão a limitar o número de voos que podem ir para o aeroporto de Schiphol. Estão a mudar a forma como algumas ruas funcionam, com o fluxo de trânsito. Noutros lugares, estão a limitar o número de pessoas que podem seguir um guia turístico a 10 pessoas, para que não haja multidões gigantes a bloquear as ruas. Em muitos lugares, estão a restringir o Airbnb. Há muitas respostas diferentes para isso. Cada país tem de encontrar a sua solução específica. O que vai funcionar para o governo e para as pessoas que lá vivem? Além disso, trazer muito turismo, porque muitos negócios estão a ganhar dinheiro. É uma das maiores fontes de rendimento.

Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março
Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março Daniel Levine na VisitPortugal Conference, a 11 de março

Quais são os destinos ou países que acha que estão subvalorizados e que serão grandes ou deveriam ser grandes nos próximos anos?
Isso leva-me de volta à sua pergunta sobre o TikTok e as redes sociais, porque muitas vezes vemos esses lugares específicos a serem invadidos, não necessariamente países ou até cidades, mas lugares dentro dessas cidades. Há sempre outros locais que ainda não foram descobertos. O desafio é que, às vezes, esses locais não têm toda a infraestrutura que as pessoas procuram.

Há esse equilíbrio. Onde posso ir que tenha infraestrutura suficiente e ainda esteja por descobrir? Há um termo chamado pistas virgens, lugares onde as pessoas ainda não foram. A melhor forma de pensar sobre isso é que não se trata tanto de um país, porque não há tantos deles e as pessoas já ouviram falar deles, mas quando pensas em ir a um país, vai para lugares de que nunca ouviste falar antes. Esse é o meu segredo. Talvez tenha ouvido falar deles ou algo assim, mas nunca realmente ouviu falar deles. Esses são os lugares que estão a crescer, que terão infraestrutura suficiente, que ainda não estão sobrecarregados. Acho que a maioria das pessoas tem medo de ir lá. Depois, quando se tornam populares, as pessoas dizem "ah, devia ter ido lá há cinco anos".

A sua pergunta, por outro lado, também significa que tens de ser um turista um pouco aventureiro. E existem diferentes tipos de viajantes. Os viajantes que vêm a Portugal pela primeira vez querem ir a Lisboa, querem ir ao Porto, e talvez ao Algarve. É o que ouviram falar e o que sabem. Vai ser necessário um viajante mais sofisticado, alguém que já tenha estado aqui, que queira ver outra parte e realmente conhecer o que Portugal é.