Durante o inverno, há fado na Madragoa, mais especificamente no renovado Convento das Bernardas, onde, desde 2024, existe o restaurante No Convento. Estes serões imperdíveis com música e gastronomia acontecem à luz do lume de mais de 100 velas.
A nova temporada do Fado No Convento chega com atuações únicas de terça-feira a domingo, levadas a cabo por vários fadistas, em sessão dupla (às 20h30 e às 21h30). É um fado com raízes históricas, mas diferente e mais atual. A TRAVEL MAGG esteve presente numa destas noites de homenagem.
Nani Medeiros foi a protagonista, apoiada pela guitarra portuguesa de João Pita. A cantora brasileira trouxe um mix entre a canção urbana de Lisboa e bossa nova, apresentado em acústico, e de fazer eriçar os pelos.
Assim como Nani Medeiros, apresentam-se no Fado No Convento artistas como Ana Paula Martins, Custódio Castelo, Luís Carlos e Acácio Barbosa. A curadoria da programação cabe à Diretora Musical do Reia Collective, Joana de Souza Dias, com mais de 20 anos de experiência em cultura, arte e música.
O jantar
Encabeçado pelo chef João de Oliveira, o restaurante segue uma cozinha de influência francesa com produto português. "Começámos mais com as receitas francesas puras e duras, porque a ideia é pegar em receitas francesas e trabalhar o produto português, com muita pesquisa", explicou, numa das visitas à nossa mesa.
E porque esta experiência imersiva também vive da história, a abertura das hostilidades foi assinalada por um chá de canela. Esta bebida, que surgiu em jeito de boas-vindas, foi escolhida por ser tradição no século XV, quando era a especiaria mais trocada.
Quanto à comida, começámos por umas divinais vieiras seladas com molho de coral, açafrão e gel de limão (17€) e um multifacetado foie gras com pêras cozidas em vinho tinto, legumes sazonais, manteiga de pêra e pão brioche tostado (23€).
Como prato principal, optámos pela coxa de pato confitada com creme defumado de cenoura, couve kale orgânica assada, cenouras baby e molho gastrique de laranja (36€), que não desiludiu, e piscámos o olho ao tournedó rossini, um lombo de vitela assado com foie gras de pato, brioche, espargos verdes e puré de batata, finalizado com demi-glace trufada (38€).
Mas também há bacalhau confitado com puré de nabo, batata fondant, espinafres salteados com manteiga noisette, plâncton e azeite do Alentejo (36€) ou corvina da nossa costa com arroz de tomate assado, salicórnia de Aveiro com molho de espinafres, gengibre e ervas aromáticas (46€).
É também possível optar por carnes confecionadas no josper, com flor de sal e tomilho com molho béarnaise, como wagyu 170g (78€), chuletón dos Açores 650gr (76€) ou entrecôte maturado 350gr (53€).
Para sobremesa, alternámos entre a mousse de chocolate amargo 85% com laranja, casca de laranja cristalizada e texturas de praliné de pinhões (8€) e o crème brûlée de baunilha com “Bourbon Beans” e frutas vermelhas da estação (13€).
"A mousse em si não leva açúcar nenhum. A ideia é ir buscar os elementos — pinhão, laranja.... Só não faço o chocolate aqui", revelou o chef, numa das pausas, sem esconder o desgosto por não provarmos o pudim Abade de Priscos.
Nas bebidas destacam-se os cocktails de assinatura, como o cilandro sour, com mezcal, absinto, cordial de coentro, limão, aquafaba e óleo de coentro (15€) e o beetroot bloody mary, com vodka, limão, sumo de beterraba, molho de soja, sal e tabasco (13€).
Porém, é ainda possível emparelhar estes pratos sofisticados com mocktails, cervejas, refrigerantes, sumos naturais, águas, cafés, vinhos a copo desde 7€, espumantes, tintos, brancos, rosés e laranjas.
O espaço
Este convento do século XVII em Santos ficou muito destruído depois do terramoto de 1755. Foi reconstruído por freiras que lá residiram até à abolição das ordens, em meados do século XIX. Quando a Ordem de Cister abandonou o local, o Convento viveu muitos capítulos, desde sala de cinema, a escolas, sede da banda filarmónica e restaurante.
Em 1998, foi comprado pela Câmara Municipal de Lisboa, que o reconstruiu para realojar famílias de gerações. Por esse motivo, ao visitar este espaço fundado em 1653, verá roupas em estendais nas janelas do Convento, que pertencem a quem ali mora nos dias que correm.
Aqui funcionou, durante cerca de 20 anos, o restaurante A Travessa, que pertencia a um casal que entretanto se reformou. Na transição para o No Convento, no início de 2024, algum staff (como o chef João de Oliveira) manteve-se. É agora propriedade de franceses.
Este restaurante de fado conta também com um bar lindíssimo (chefiado por Maurício Leal), que se torna facilmente o centro das atenções, também graças à vitrina retroiluminada (pelo menos enquanto ainda toca a música ambiente). A acústica é ótima e a atmosfera acolhedora, romântica e muito intimista.
Podemos desfrutar da nossa refeição e assistir às atuações em confortáveis sofás, estofados com veludo. As duas salas de jantar estão praticamente só iluminadas por velas verdadeiras, que têm todo um outro charme em comparação com as de LED.
Este conceito foi desenvolvido pelo Reia Collective, onde estão inseridos a casa reîa, o No Convento e o Black Trumpet. Proporciona nada mais nada menos que uma experiência envolvente e especial, entre paredes centenárias e tons terra, que qualquer um deveria viver nem que fosse uma vez.